Lição 09 – Vontade – O que move o ser humano

Por: Coop. Geisel de Paula

Texto base: Gálatas 5.16-21; Tiago 1.14,15; 4.13-17

Já estudamos duas das principais faculdades da alma: o intelecto (razão ou pensamentos) e a sensibilidade (os afetos ou sentimentos). Neste capítulo, estudaremos a terceira faculdade: a vontade (volição ou desejo). Tanto o Budismo quanto o Hinduísmo tem como objetivo a libertação dos desejos. O Budismo vê o desejo (tanha) como a raiz do sofrimento pois é um apego ao ‘eu’ ilusório. Vejo muita verdade nisso pois até mesmo nós crentes, orbitamos a vida cristã colecionando vontades e desejos. O Céu de glória não deixa de ser uma libertação de todos os desejos terrenos e carnais. Viveremos uma outra dimensão, superior e diferente do plano terrestre. Será uma espécie de nirvana do Budismo? Não é o que a Bíblia diz. O desejo de cessar o desejo também não seria um desejo? A ideia de Nirvana não seria contraditória?

Hans Walther Wolff, autor da obra ‘Antropologia do Antigo Testamento’, disse com muita propriedade sobre os desejos do coração: “ Jó, com uma expressão estranha, contesta, ao declarar sua integridade (31.7),que jamais "o seu coração correu atrás dos seus olhos", isto é, que seu desejo secreto jamais se deixou determinar por aquilo que lhe cativava a vista”. No seu texto, o autor apresenta um estudo do emprego do termo hebraico nephesh (alma) ao longo do Antigo Testamento, destacando que, em várias passagens, tem o significado de goela, boca ou garganta, como é o caso de Isaías 5.14, Habacuque 2.5, Salmos 107.5 e Eclesiastes 6.7. O que mais nos importa notar aqui é a relação da alma com a fonte dos desejos humanos”. Com base nisso, o autor elabora o que podemos chamar de um conceito para alma: o impulso da ânsia humana como sujeito do desejar. Com isso, concluímos que os desejos nascem na alma (Sl.42.1,2).

Assim afirma o autor Silas Queiroz: “A vontade é uma força interior dada por Deus e que põe o ser humano em movimento em todas as áreas da vida. Essa força foi corrompida com a Queda (assim como tudo o mais no homem), mas ainda se mostra vital para a existência humana. Num sentido geral, vontade ou volição pode ser conceituada como a capacidade humana de desejar, querer, almejar, escolher e agir”. Esse pode ser considerado um aspecto positivo da vontade. A vontade pode ser entendida também como motivação. Sem desejo ou vontade, não há motivação e, via de consequência, ação. Em um sentido geral, sempre agimos movidos por nossa vontade. Stanley Horton diz em seu livro de Teologia Sistemática: “A conversão é um exemplo de mudança na vontade humana, que se dá por meio do arrependimento (At.3.19). Como afirma Daniel B. Pecota (HORTON, 1996, p. 368): “Embora o arrependimento envolva as emoções e o intelecto, é a vontade que está mais profundamente envolvida”. Todo o verdadeiro cristão é alguém que, impulsionado pela graça de Deus, renunciou a sua própria vontade para fazer a vontade de Cristo (Mt.16.24). É o livre-arbítrio funcionando (Hb.2.3; 3.7-13; Ap 22.17).

Um exemplo de desejo e vontade é a vontade de comer. Será ela puramente fisiológica? Se fosse, comeríamos qualquer coisa que pusessem em nossa frente. Mas não agimos assim. Comemos o que desejamos, na maioria das vezes. Ainda Queiroz: “Ser escravo dos próprios desejos é uma das circunstâncias mais trágicas que o ser humano pode enfrentar. Isso, porém, não acontece senão após uma rebelde insistência do homem em agir frontalmente contra a vontade divina. Não raro essas atitudes revelam ingratidão, como aconteceu com o povo hebreu no deserto. O texto de Números 11.1-10 nos apresenta um povo cheio de fraquezas, que provocava a Moisés e a Deus com lembranças infantis. A nephesh dos hebreus recusava o maná que Deus havia-lhes enviado (Nm.11.7-9) e ansiava pelas comidas do Egito. Isso mostra mais uma vez a correlação entre a alma e os desejos do homem necessitado no seu aspecto fisiológico, além de apontar para a conexão da volição com a condição espiritual. Tudo neles conspirava contra a vontade de Deus.

Em relação a essa dualidade: DESEJO X VONTADE vem à lembrança a poesia maravilhosa da mineira de Divinópolis – Adélia Prado, poetisa, filósofa e contista de elevados méritos, autora de “Coração Disparado”, quando escreveu: ”Eu não quero a faca e o queijo. Quero a fome”. Ao refletirmos no que diz a poetisa, verificamos que a fome é o desejo, algo instintivo, uma vez que comemos quando estamos com fome para satisfazer a necessidade do nosso organismo. Por que desejamos algo? Certamente porque aquilo parece ser muito bom para nós, e a sua falta nos faz sofrer terrivelmente. E, não sem razão, o filósofo Spinoza (1632-1677) nascido em Amsterdam, um dos grandes nomes do racionalismo do século XVII, ao lado de Descartes e Leibnitz, na sua obra “ÉTICA”, nos diz que “Não é porque uma coisa é boa que a desejamos, mas, porque a desejamos ela parece ser boa”. O desejo, para ele, é a verdadeira essência do homem.

Será que é possível desejar coisas boas? Em sua opinião, é possível gostar de orar? Gostar de jejuar? Gostar de ler a Bíblia? Gostar de levantar-se cedo para ir a Escola Dominical? Eu sinceramente creio ser possível sim, cada uma dessas coisas, mas com o desenvolvimento de uma prática, de se criar um hábito que vai virar uma rotina, e que pode ser que se transforme em um prazer (Sl.119.70,77,92,174; Rm.7.22). Acredito que para chegar nesse ponto é preciso muita disciplina primeiro (será igual aos academizeiros que não conseguem ficar sem ir à academia?).

Queiroz afirma: “O drama dos desejos humanos continua na era cristã com uma diferença fundamental: Cristo venceu o pecado e dá poder a nós para que também o vençamos (ver Rm.6.6). Mas, enquanto estamos neste corpo mortal, há um conflito espiritual constante. Todo cristão precisa decidir diariamente entre a sua vontade e a vontade do Espírito (Gl.5.17). A carne (sarx, natureza pecaminosa) tem os seus próprios desejos, que são contrários ao Espírito (pneuma). Vê-se, então, uma luta travada em nosso interior. Compete-nos decidir entre satisfazer os desejos da carne, que são pecaminosos, ou atender a voz do Espírito e viver segundo a sua direção (Gl.5.18).

E ainda Queiroz: “Paulo expõe o seu drama pessoal entre a vontade do homem espiritual e a vontade do homem carnal, vendido sob o pecado: “Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum; e, com efeito, o querer está em mim, mas não consigo realizar o bem” (Rm.7.18). Isso significa que a vontade do homem natural, não regenerado, não é suficiente para vencer a força do pecado”.

A parábola dos dois lobos - Um avô Cherokee conta ao neto sobre dois lobos que vivem dentro de cada um de nós. Um lobo representa a raiva, o ciúme, a inveja e a ganância, enquanto o outro representa a paz, o amor, a bondade e a alegria. O neto pergunta qual lobo vence a luta, e o avô responde que vence aquele que for alimentado. A parábola sugere que nossas escolhas e o foco que damos a certos sentimentos moldam nossa realidade e quem nos tornamos.

Queiroz ressalta: “O apóstolo Tiago certamente nos legou um dos textos mais claros e contundentes a respeito do processo de atração do pecado em decorrência dos maus desejos humanos: “A tentação vem de nossos próprios desejos, que nos seduzem e nos arrastam. Esses desejos dão à luz o pecado, e quando o pecado se desenvolve plenamente, gera a morte” (Tg.1.14,15, NVT). Em primeiro lugar, vemos que a tentação só tem efeito porque existem desejos pecaminosos. Em segundo lugar, há um processo que começa sutil, sedutor, e que se fortalece até o ponto de arrastar-nos”. Olhando assim, parece que o Diabo tem a vantagem em nos atrair e seduzir, afinal de contas, ele conhece o ponto fraco de cada ser humano. Mas temos a promessa de Deus de que não seremos tentados acima de nossas forças (1 Coríntios 10.13).

Queiroz finaliza assim sua discrição sobre a vontade: “Quando guiada por Deus, a vontade é uma extraordinária bênção, pois é ela que nos move para pequenas e grandes realizações. Uma pessoa sem vontade perde o sentido da existência. Uma das características da depressão é a perda de vontade, do interesse ou prazer em realizar as coisas mais simples da vida. Como é bom amanhecer motivado todos os dias! O ânimo e o entusiasmo fazem parte de uma vontade sadia e ativa. Quem nos deu foi Deus, e ambos servem para impulsionar-nos para novos projetos, independentemente da fase da vida. É Deus quem renova nosso ânimo a cada manhã e que nos dá sonhos (planos e projetos) para todo o tempo da vida que Ele planejou para nós.

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QUEIROZ, Silas. Corpo, alma e espírito – A restauração integral do Ser Humano para chegar à estatura de Cristo. Editora CPAD. Rio de Janeiro. 2025. 1ª Edição.

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