Lição 11 – Uma igreja hebreia na casa de um estrangeiro
Texto base: Atos dos Apóstolos 10.1-8, 21-23, 44-48
De que forma temos visto o agir de Deus no mundo? Será que só temos olhos para aqueles que são necessariamente parecidos conosco? Será que do nosso ponto de vista, cremos que Deus só pode usar alguém de uma igreja evangélica tradicional, com cartão de membro, que se veste ‘adequadamente’, que saiba o ‘evangeliquês’ correto e que pregue a Bíblia de maneira tradicional? Será que Deus tem uma forma única de trabalhar?
O que essa passagem de Atos 10 nos mostra? Será que para um judeu tradicional, pensar na salvação de um gentio era tão fora da caixa assim? Infelizmente, era. Parece notável o esforço que Deus precisou fazer para que Pedro pudesse estar preparado para compartilhar a sua fé com alguém ou alguns que não eram judeus. Cornélio foi o nome do primeiro gentio, ou seja, não judeu e incircunciso a se converter ao Cristianismo. Era responsável por comandar uma centúria (100 homens) da coorte chamada italiana (aproximadamente 600 homens), provavelmente um romano de nascimento. Ele aparentemente guardava toda a Lei de Moisés, exceto a circuncisão (613 mandamentos, será?). A guarda do sábado e as leis dietéticas eram muito estranhas aos não judeus.
Segundo o autor José Gonçalves: “Convém destacar que, em relação à religião judaica dos dias do Novo Testamento, é possível identificar três classes de pessoas. Primeiramente, temos o judeu de nascença, considerado o povo da aliança. Foi aos judeus que Deus havia se revelado (Gn.12.1). Em segundo lugar, temos o “prosélito”, um gentio que se convertia ao judaísmo, submetia-se ao rito da circuncisão e guardava todas as leis cerimoniais. Por último, temos os “tementes a Deus”, um gentio monoteísta que aceitava a maioria das leis cerimonialistas do judaísmo, incluindo a observância do sábado e prescrições alimentares sem, contudo, submeter-se ao rito da circuncisão”.
Fato é que para Pedro era ponto pacífico de que o Evangelho deveria ser transmitido apenas a judeus. Ele precisou ser convencido por Deus do contrário. E o convencimento precisou ser elaborado, nada de ‘é assim a partir de agora, pronto acabou’, como nossas mães nos falavam em nossa infância. Foi preciso uma construção lógica. Primeiro, Deus se revelou (a sua vontade) para o próprio Cornélio, através de um anjo, dizendo que suas orações e esmolas tem subido como memorial diante de Deus (Ml.3.16-18) e que mais detalhes serão explicados procurando um homem específico, à saber, Simão Pedro, que está hospedado na cidade de Jope, com um certo Simão curtidor, em uma casa junto do mar. E completa: “Ele te dirá o que deves fazer”, “para que te salves, tu e toda tua casa” (At.11,14). Até esse ponto, Pedro ainda não estava pronto.
Enquanto a comitiva de dois servos e um soldado partiam em busca de Pedro, Deus agora precisava convencer o próprio Pedro para fazer parte dessa nova jornada. Os 64 km de distância deveriam bastar. Enquanto isso Pedro subiu no terraço da casa perto do meio-dia para orar. Quando a barriga roncou de fome, Pedro sofreu um arrebatamento de sentidos (uma visão celestial?), quando viu o céu aberto descendo um vaso, atado nas quatro pontas em forma de lençol contendo animais quadrúpedes, feras, répteis e aves do céu. E uma voz que dizia: “Levanta-te, Pedro, mata e come”. Pedro rejeitou veementemente. E a voz lhe disse: “Não faças tu comum ao que Deus purificou”. Deus precisou repetir o processo mais duas vezes para que Pedro começasse a acreditar.
Quando a dúvida ainda pairava, chegaram à porta os enviados de Cornélio, perguntando por Pedro. Deus falou através do Espírito no coração de Pedro: “Três homens te buscam. Levanta-te pois, desce, e vai com eles, não duvidando; porque eu os enviei”. Quando Pedro se inteirou de todas as informações, convidou aqueles sujeitos para entrar e no dia seguinte, partiram com mais seis irmãos (Pedro precisava de algumas testemunhas para verificar se de fato, aquilo era obra de Deus) de Jope para Cesaréia onde Cornélio já estava esperando, tendo convidado os seus parentes e amigos mais íntimos.
Ao sair para recepcionar a Pedro, Cornélio prostrou-se aos pés de Pedro e o adorou. Note-se que o conhecimento da Lei que Cornélio tinha não devia ser tão grande assim, ou que a aparição do anjo deve ter lhe deixado muito sobressaltado em relação a essa pessoa especial que o anjo tinha lhe revelado. Fato é que Pedro colocou as coisas em seu devido lugar: Deus no lugar dele, ele em seu lugar, e Cornélio no lugar dele: “Levanta-te que eu também sou homem”. Pedro entrou na casa de Cornélio e viu o ambiente cheio de gentios. Então ele disse mais ou menos assim: “Eu como judeu nem devia estar no mesmo ambiente que vocês mas Deus me mostrou que a nenhum homem eu posso chamar de comum ou imundo. Visto isso, eu vim sem contradizer. Pergunto: Por que razão mandaste chamar-me”?
Então Cornélio contou a sua história. E terminou dizendo: “E agora, o que devemos fazer”? Restava a Pedro contar a mais fantástica de todas as histórias e a maior de todas as descobertas: A de que Deus não faz acepção de pessoas. Ninguém? Pelo jeito, não. Isso quer dizer que Deus ama os Testemunhas de Jeová? Sim. E os ateus existencialistas? Também. Artistas da Globo? Ahã. Macumbeiros, ufólogos, terraplanistas, turma do LGBT..., pedófilos, adeptos da Ku Klux Klan, neonazistas, ditadores, esquerdistas, assassinos, estupradores e políticos. Todos estão debaixo do guarda-chuva da graça de Deus. Quem somos nós para julgar quem é digno e quem não é? Deus repete a sentença: “Não faças comum o que Deus purificou”.
O autor José Gonçalves frisa muito bem: “Deus é amor. O amor é próprio da natureza divina. O seu amor modera a sua justiça em misericórdia e graça. É um erro pensar que Deus quer condenar certas pessoas arbitrariamente (calvinismo). O seu poder e sabedoria foram mostrados na criação, mas o seu amor é mostrado em redenção. O homem precisava muito de misericórdia, mas não a merecia o mínimo. Cristo morreu por nós enquanto ainda éramos pecadores (Rm.5.8). O amor divino deu à luz a graça. A graça divina deu à luz a redenção mediante a morte de Cristo, e a redenção deu à luz a salvação”.
E ainda pontua: “A salvação, portanto, é pela fé, e não pelo destino; pela graça, e não pela arbitragem; por escolha, e não por compulsão. Foi planejada e provida pela soberania do amor, sendo recebida e desfrutada pela fé. A salvação está condicionada à fé do homem: “Pela graça sois salvos”. O caminho da salvação de Deus é absoluto e arbitrário: “Sendo justificados livremente pela sua graça”, isto é, sem o mérito do homem. A graça foi mostrada através da redenção (Rm.3.24-25); esse é o lado de Deus. “Salvo pela fé” é o lado do homem”.
Temor e justiça que Pedro prega é o segundo estágio da salvação, faz parte do produto da salvação e não da causa. “A Palavra que é o Verbo encarnado aconteceu depois da pregação do batismo proposto por João, o Batista. O que Jesus fez só foi possível porque Deus era com ele. E por causa disso o mataram, pendurando-o num madeiro, o qual ressuscitou ao terceiro dia, da qual somos também testemunhas e assim foi constituído juiz dos vivos e dos mortos, da qual os profetas já falavam e todos aqueles que crerem nele, receberão o perdão dos pecados pelo seu nome”.
Quando Pedro estava concluindo o seu sermão, a Bíblia diz que “caiu o Espírito Santo sobre todos os que ouviam a palavra”. Atos 2 se repetia agora em território gentio. E todos eles começaram a falar em línguas e a magnificar a Deus. Esse fato é confirmado pelas palavras do apóstolo Pedro, que via a experiência pentecostal dos gentios igual àquela que os apóstolos tiveram no Pentecostes: “estes que também receberam, como nós, o Espírito Santo?” (At.10.47). Para Pedro, portanto, os gentios haviam recebido a mesma experiência que eles haviam recebido no Pentecostes: “E, quando comecei a falar, caiu sobre eles o Espírito Santo, como também sobre nós ao princípio” (At.11.15).
Pedro então ficou sem alternativas, dizendo aos seus acompanhantes: “Pode alguém porventura recusar a água, para que não sejam batizados estes, que também receberam como nós o Espírito Santo”? A diferença entre o nós e eles é: nenhuma. Concluindo: “E mandou que fossem batizados em nome do Senhor. Então rogaram-lhe que ficasse com eles por alguns dias”. Pedro precisou relatar o acontecido à igreja de Jerusalém. Que relutantemente, acabou aceitando que a nova fé fosse também recebida pelos gentios (At.11.1-18).
Geisel de Paula
Bibliografia
EARLE. Ralph. MAYFIELD. Joseph H. Comentário Bíblico Beacon – João a Atos. Editora CPAD. Rio de Janeiro. 1ª edição. 2006.
NEE. Watchman. A vida cristã normal. Editora Fiel. São José dos Campos.
GONÇALVES. José. A Igreja em Jerusalém – Doutrina, comunhão e fé: a base para o crescimento da Igreja em meio às perseguições. Editora CPAD. Rio de Janeiro. 1ª edição. 2025.
https://search.nepebrasil.org/
https://boullan.wordpress.com/2017/01/21/conversao-de-moedas-e-valores-tudor-para-atualmente/


